Toxoplasmose: o contato com gatos não é fator determinante para transmissão da doença
No programa Bom dia ES da TV Gazeta exibido no dia 22 de maio de 2019, foi realizada uma entrevista com o Médico Infectologista Dr. Lauro Ferreira Pinto que falou sobre a transmissão, sintomas e prevenção da Toxoplasmose. O Conselho Regional de Medicina Veterinária do Espírito Santo (CRMV-ES) gostaria de ponderar alguns esclarecimentos sobre as informações divulgadas na entrevista.
A Toxoplasmose é uma zoonose de incidência mundial causada pelo protozoário Toxoplasma gondii que pode ser transmitida ao homem principalmente pela ingestão de alimentos contaminados, como frutas e verduras, além de carne crua ou mal cozida contendo cistos. Apesar dos felinos terem um papel muito importante no ciclo da doença, desenvolvendo a reprodução sexuada do protozoário, o contato com o gato envolve parte muito baixa na transmissão da doença (SANTOS; SOUZA; PEREIRA, 2018).
Segundo o Protocolo de notificação e investigação: Toxoplasmose gestacional e congênita (BRASIL, 2018), as principais vias de transmissão são: “oral” e “congênita”. Em casos raros pode haver transmissão por inalação de aerossóis contaminados, pela inoculação acidental, transfusão sanguínea e transplante de órgãos (ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD, 2003; CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION, 2015).
O Ministério da Saúde deixa bem claro em sua página institucional que “é importante saber que o contato com gatos não causa a doença. O perigo está no contato com as fezes contaminadas do felino e no consumo de água contaminada e alimentos mal lavados ou mal cozidos”.
Segundo o Infectologista Celso Granato, professor da Universidade Federal de São Paulo e assessor médico do laboratório Fleury, o gato não é o grande vilão da doença porque não é o principal culpado pela disseminação. "O ciclo do protozoário Toxoplasma gondii tem que passar pelo gato, mas o animal leva uma culpa maior do que merece. O que acontece na prática é que há mais chances de se contrair a doença tomando água contaminada, comendo carne vermelha crua, salada e usando utensílios contaminados".
O gato também contrai o Toxoplasma quando come carne crua ou mal passada ou, ainda, ao ingerir insetos, ratos e lagartixas que contenham cistos do protozoário. Portanto, cabe ressaltar que nem todos os gatos contraem a Toxoplasmose e que os animais estritamente domiciliados (aqueles que ficam dentro de casa ou apartamento), alimentados com ração comercial e sem contato com a rua, correm um risco insignificante de se contaminar.
Visto que os gatos apenas eliminam oocistos por 1 a 2 semanas após tornarem-se infectados e que estes oocistos se encontram ainda não esporulados (não infectantes), e como sua esporulação ocorre no meio ambiente (o que leva de 1 a 5 dias) e visto que a maioria dos gatos são minuciosos em seus hábitos de limpeza, a exposição a oocistos infectantes não é fonte importante de infecção para gatos, cães ou o homem (NEGRI et al, 2008). É importante esclarecer que o gato, caso infectado, só libera os oocistos uma única vez durante toda a sua vida (SANTOS; SOUZA; PEREIRA, 2018).
Salientamos que o consumo de carnes ou derivados crus tem sido a principal via de transmissão para os humanos, sendo que as de ovinos, caprinos, suínos e equinos têm maior importância, por normalmente apresentarem maior frequência de cistos teciduais, enquanto as de bovinos e aves comerciais possuem menor relevância (TENTER et al, 2000). Segundo DA SILVA et al. (2004), a carne suína é a principal fonte de infecção de Toxoplasmose para o homem, pois os cistos podem permanecer viáveis por 171 dias na carne.
É importante atentar-se para o comércio ilegal de produtos de origem animal. Uma pesquisa demonstrou que em Belém (PA) foi diagnosticada a prevalência de anticorpos contra T. gondii de 50% nos suínos destinados ao abate sem inspeção sanitária (FREITAS, 2009).
Segundo o Ministério da Saúde, a principal medida de prevenção da Toxoplasmose é a promoção de ações de educação em saúde, principalmente em mulheres que estão em idade fértil e pessoas com imunidade comprometida. É fundamental manter uma higiene alimentar.
A Organização Mundial de Saúde promove uma abordagem denominada “One Health” (Saúde Única) que tem como objetivo projetar e implementar programas, políticas, legislação e pesquisa em que vários setores se comunicam e trabalham juntos para alcançar melhores resultados de saúde pública. A Saúde Única propõe a atuação conjunta da Medicina Veterinária, da Medicina humana e de outros profissionais da saúde.
Como órgão de consulta dos governos da União, dos Estados, dos Municípios e dos Territórios, em todos os assuntos relativos à profissão de médico-veterinário ou ligados, direta ou indiretamente, à produção ou à indústria animal, estamos à disposição para esclarecer dúvidas sobre zoonoses e demais assuntos envolvendo animais e o ser humano sempre no intuito de contribuir para uma sociedade mais saudável, esclarecida e empoderada.
O CRMV-ES agradece a todos os profissionais Médicos Veterinários que contribuíram para a elaboração deste texto, tais como, Dra. Érica Baffa, Dra. Tamara Jareta, Dra. Polyana Paixão, Dr. Marco Rocha, entre tantos outros e à Comissão de Saúde Pública do Conselho que fez também suas considerações e revisão final do documento, e reforça que a atuação da Autarquia, a partir dos seus profissionais médicos veterinários e zootecnistas é, além do cuidado com os animais de companhia, selvagens ou de criação, ajudar a promover a saúde humana e a melhorar as condições ambientais.
CRMV-ES