O diagnóstico precoce e a prevenção são importantes em qualquer câncer
O Câncer, como sinônimo de neoplasia maligna, é o resultado do acúmulo progressivo de modificações genéticas e epigenéticas, em proto-oncogenes, genes supressores de tumor, genes para apoptose e reparo do DNA, resultando em proliferação celular desordenada e comprometimento da função normal dos órgãos em que se desenvolvem. A célula cancerígena pode se originar de qualquer tecido do corpo e tem a capacidade de provocar destruição local (tumor), à distância (metástase) e sistêmica. Esta mediante a ocorrência de síndromes paraneoplásicas (sinais clínicos secundários à substâncias humorais liberadas pelas células tumorais ou por células normais estimuladas pelas células neoplásicas).
A Oncologia é hoje uma especialidade de destaque na Medicina Veterinária: pela elevada morbidade e mortalidade de algumas patologias e também pela elevada incidência na clínica de pequenos animais. Dados internacionais mostram que em cães, representa de 16% a 23% da causa de óbito, tornando-se a mais comum em animais idosos, com maior incidência em raças puras, com destaque para Rottweiler, Labrador, Golden Retriever, Boxer, Bulldogue e Pastor-Alemão.
Nos gatos, apesar da menor incidência, observa-se um comportamento biológico mais agressivo e uma probabilidade de malignidade 2,3 vezes maior do que nos cães. Devido à influência das retroviroses, nessa espécie, com destaque para o vírus da leucemia felina e da imunodeficiência felina, observa-se um pico de incidência, também, em animais jovens, com menos de três anos de idade, associado principalmente ao desenvolvimento de linfomas de alto grau, na forma mediastinal, multicêntrica e extra-nodal. A predisposição racial é menos pronunciada do que em cães, e gatos sem raça definida, são frequentemente mais acometidos, embora gatos da raça Siamês possam estar mais predispostos ao desenvolvimento de linfoma e neoplasias mamárias.
Nota-se, nos pequenos animais, a prevalência de alguns tipos tumorais, sendo o de maior incidência as neoplasias de pele. Em sequência, os tumores de mama, as neoplasias hematopoiéticas, as orofaríngeas e o Tumor Venéreo Transmissível Canino (TVTC). Nos gatos, a incidência de doenças linfoproliferativas é maior, ultrapassando a casuística e neoplasias mamárias e, em alguns serviços, até mesmo das neoplasias cutâneas.
O diagnóstico precoce e prevenção são importantes em qualquer câncer, contudo, deve-se considerar características específicas de cada neoplasia para abordar esses tópicos. Nas cadelas, os tumores mamários constituem 52% de todos os tumores diagnosticados nessa espécie. A estimulação estrogênica, o emprego de contraceptivos (progestágenos) e a alimentação rica em gorduras são considerados fatores de risco para a doença. Todavia, para a prevenção indica-se a supressão hormonal através da ovariohisterectomia, reduzindo o risco em 0,05%, quando realizada antes do primeiro cio, 8% após o primeiro ciclo estral e 26% depois do segundo. Nas gatas, a ovariohisterectomia também apresenta efeito protetor para o desenvolvimento de neoplasias mamárias reduzindo o risco em 91%, 86% e 11% quando a esterilização é realizada antes dos seis meses de idade, entre os sete e doze meses, e com 13-24 meses, respectivamente.
A Ovariohisterectomia e a Orquiectomia, apresentam-se ainda como métodos preventivos também quando se trata do TVTC, inibindo comportamentos sexuais facilitadores da disseminação da doença. Nos cães machos, a Orquiectomia também apresenta efeito protetor em relação ao desenvolvimento de adenomas perianais. No entanto, estudos recentes têm apontado para alguns infortúnios da castração, particularmente em algumas raças, podendo aumentar o risco do desenvolvimento de alguns tipos tumorais, como osteossarcoma, mastocitoma, linfoma, hemangiossarcoma e tumores da próstata. Com isso, deve-se levar em consideração esses fatores para a tomada de decisão em relação ao melhor momento de indicar a castração. A decisão pela castração deve ser feita, portanto, de forma consciente, considerando os riscos e benefícios do procedimento.
Em gatos, a castração pode auxiliar ainda no controle da disseminação de retroviroses, minimizando o acesso do paciente às ruas, brigas e comportamentos sexuais que possam favorecer a transmissão. A vacinação para FeLV está disponível no Brasil, sendo altamente recomendada, principalmente em regiões endêmicas. A vacina para FIV, utilizada nos Estados Unidos, é ainda controversa, pois existem estirpes virais distintas e ainda não se sabe sobre a ocorrência de proteção cruzada. Além disso, pode interferir nos métodos diagnósticos de triagem, o que não ocorre na vacinação contra a FeLV.
Acerca de prevenção, destaca-se ainda a ocorrência de tumores de pele, relacionados à exposição ultravioleta, como o hemangiossarcoma e o carcinoma de células escamosas (carcinoma epidermóide), principalmente em animais com pele despigmentada. Esses pacientes, com histórico de exposição constante, desenvolvem, inicialmente, lesões pré-cancerígenas, denominadas dermatite actínica. A prescrição para utilizar filtros solares e evitar o sol entre 10 e 16 horas, constitue medidas preventivas.
A condição de fumante passivo de cães e gatos, parece estar relacionada com alguns tipos neoplásicos, como exemplo, felinos expostos a fumaça de tabaco, por pelo menos cinco anos, demostram 3,2 vezes mais risco de desenvolver linfoma.
O conhecimento acerca das neoplasias em pequenos animais vem aumentando de forma contínua e novos protocolos ou modalidades terapêuticas surgem a todo o tempo. Diante desse cenário, o especialista, mas também o clínico geral, deve se manter atualizado e oferecer o melhor tratamento possível ao seu paciente, permitindo aumentar a sobrevida enquanto mantém a qualidade de vida dos pacientes. Dessa forma, para a continuidade no processo de melhoria, encoraja-se a prevenção, o diagnóstico precoce e o tratamento do câncer nos animais de companhia.
04 de fevereiro. Dia Mundial do Câncer.
Bruna Voltolin de Sena – Médica Veterinária do Hospital Veterinário da Universidade Vila Velha.
Rodrigo dos Santos Horta – Professor do curso de graduação em Medicina Veterinária e mestrado em Ciência Animal da Universidade Vila Velha