Dia Mundial de Conscientização sobre Linfomas – 15 de setembro
No Dia Mundial de Conscientização sobre Linfomas (15 de setembro) convidamos o Dr. Rodrigo dos Santos Horta, graduado em Medicina Veterinária pela Universidade Federal de Minas Gerais (2010), mestrado (2013) e doutorado (2016) em Ciência Animal – Medicina e Cirurgia Veterinárias, nessa mesma instituição, em parceria com a University of Cambridge (Reino Unido), atualmente é membro da Sociedade Latinoamericana de Oncología Veterinária (SLOVET) e professor titular do curso de Medicina Veterinária na Universidade Vila Velha (ES, Brasil), para falar um pouco mais sobre o assunto:
Contextualização.
O que é o linfoma? O linfoma é o câncer derivado dos linfócitos. Inicia-se, na maioria das vezes nos linfonodos,sendo a apresentação multicêntrica a mais comum em cães e a forma mediastínica a mais comum em gatos jovens, infectados pelo vírus da leucemia felina (FeLV). Entretanto, pode ocorrer em qualquer órgão do corpo, a exemplo da forma gastrointestinal, frequente em felinos idosos, não infectados pelo FeLV, e a forma cutânea em cães.
Tipos de linfoma? O linfoma pode ser classificado quanto a sua apresentação clínica, conforme descrito anteriormente, mas também de acordo com suas características histopatológicas e imunofenótipo (células B, T ou NK). Existem mais de 30 tipos de linfoma, sendo que o Linfoma difuso de células grandes B é o mais comum nos cães, e os linfomas T periféricos, os mais comuns em gatos com infecção pelo FeLV. Ambos apresentam, frequentemente, graduação elevada e comportamento agressivo. Nos gatos idosos é mais frequente o linfoma entérico de células T, de baixo grau. Existem ainda linfomas indolentes, com curso insidioso, com destaque para o linfoma de zona T, e os linfomas de células B: folicular, de zona marginal e de células do manto.
Prevalencia em Cães e Gatos. O linfoma é a neoplasia hematopoiética mais comum em cães e gatos. Representa a terceira neoplasia mais frequente em cães e o câncer mais comum em gatos.
Sinais clinicos. Os sinais clínicos dependem da localização da doença. Na forma multicêntrica, mais comum em cães, os sinais podem ser inespecíficos e incluem letargia, cansaço e hiporexia. O exame físico pode evidenciar o aumento exagerado dos linfonodos, que passam a ter consistência firme. Nos gatos, o linfoma multicêntrico, comumente associado ao FeLV, resulta em lifadenopatia mais discreta e um exame minucioso pode ser necessário. Na forma mediastínica o paciente é levado ao Médico Veterinário pelo quadro de distrição respiratória. Observa-se um padrão restritivo, associado à efusão pleural, caracterizado por taquipnéia e superficialização da respiração. À auscultação pode revelar campos hipofonéticos principalmente nas regiões ventrais do tórax. Gatos com linfoma gastrointestinal apresentam perda de peso , vômito, e, em muitos casos, mas nem todos, diarreia por má-absorção. Esses gatos podem apresentar-se anêmicos, devido à doença crônica, mas também devido à deficiência de cobalamina, absorvida nas porções distais do intestino delgado (íleo). À palpação abdominal pode revelar o espessamento das alças intestinais e o aumento dos linfonodos abdominais, entretanto, o ultrassom será o exame complementar de maior auxílio para esse diagnóstico.
Qual a importancia do Linfoma no cenário da oncologia veterinária nos dias atuais? O linfoma é uma das neoplasias mais comuns em cães e gatos. O tratamento usualmente resulta em respostas favoráveis e a remissão completa pode ser obtida, com poucos dias de tratamento, embora o mesmo deva ser continuado, a fim de se obter maior intervalo livre de doença e, consequentemente, expectativa de vida. A classificação atual dos linfomas, proposta pela Organização Mundial de Saúde, promete revolucionar o nosso conhecimento sobre a doença e seu tratamentos, nos próximos anos.
Como devemos abordar um paciente com suspeita de linfoma? O paciente deve ser considerado como um portador de doença grave e sistêmica, independente da apresentação clínica. Exames hematológicos e bioquímicos devem ser realizados para a investigação de citopenias e possíveis disfunções orgânicas. Com exceção dos linfomas de baixo grau, como os que ocorrem com maior frequência no intestino dos gatos, o diagnóstico pode ser facilmente obtido pela citologia, entretanto a classificação histológica e imunofenotípica exige a realização do exame histopatológico e imuno-histoquímica. O tratamento quimioterápico deve ser instituído o mais rápido possível, considerando a rápida progressão da doença, particularmente nos gatos infectados pelo FeLV.
Quais devem ser as instruções dadas aos tutores diante de um quadro de linfoma? Os responsáveis por cães e gatos com linfoma devem-se comprometer emocionalmente com esses pacientes, mas também com tempo e recursos financeiros. Esse é, provavelmente, o momento da vida desses animais, em que eles mais precisam de seus tutores. Durante o tratamento os responsáveis devem estar atentos quanto a ocorrência de efeitos colaterais, como queda de pêlo, vômito, diarreia e infecções oportunistas (como micoses superficias, penumonias, cistites), monitorando ainda a ingestão de alimentos e água. Em geral, cães e gatos submetidos à quimioterapia, apresentam excelente qualidade de vida e o efeito colateral mais importante é a neutropenia, que embora comprometa a sequencia do tratamento, muitas vezes, não traz transtornos ao dia-a-dia do paciente.
Existe prevenção para o Linfoma em pequenos animais? Nos cães, observa-se o padrão racial como o principal fator de risco, observando-se elevada incidência da doença em Labrador, Golden Retriever, Rotweiller, Bulldogue, Boxer e Bull Mastiff. Deve-se evitar a reprodução de animais acometidos e buscar o histórico familiar na aquisição dessas raças. Em gatos jovens, a maioria dos linfomas são provocados pelo FeLV. Todo gato deve ser testado e vacinado para o FeLV, sendo o reforço, a cada três anos, condicionado ao risco que o paciente se encontra. Deve-se evitar ainda o acesso a rua e contato com gatos de procedência desconhecida, a fim de prevenir a transmissão viral. Gatos infectados pelo FeLV devem ser reavaliados e investigados quanto ao desenvolvimento de linfoma mediastinal pelo menos a cada seis meses.
Qual o tratamento instituido para o Linfoma? Quais os principais efeitos colaterais? Uma vez que o linfoma é uma doença sistêmica, a quimioterapia antineoplásica, representa a modalidade de escolha. Enquanto cães e gatos com linfomas indolentes podem ser acompanhados sem a necessidade de um tratamento específico, aqueles com linfomas de baixo grau podem ser tratados com protocolos simples de quimioterapia, administrados por via oral, a exemplo do agente alquilante de ação lenta clorambucila. Entretanto, linfomas de alto grau exigem protocolos intensos e agressivos, particularmente nos gatos com infecção pelo FeLV. Esses protocolos incluem a instituição de quimioterapia, com sessões semanais, envolvendo agentes citotóxicos como a vincristina, doxorrubicina, ciclofosfamida e lomustina. Glicocorticóides, como a prednisolona, são recomendados em todos os protocolos mas devem ser iniciados no mesmo momento da quimioterapia, a fim de evitar o desenvolvimento de resistência tumoral.
O tratamento para o linfoma é eficaz? Qual é a taxa de sucesso e recidivas? A sobrevida de cães e gatos com linfomas de alto grau, não tratados com quimioterapia, é de cerca de seis semanas, a partir do diagnóstico. O tratamento promove a remissão completa da doença em 60-90% dos casos, entretanto o maior desafio é a manutenção da remissão. Em cães pode-se obter um intervalo livre de doença médio de 6-12 meses, dependendo do protocolo instituído. Nos gatos, esse intervalo varia de 2-10 meses, dependendo da forma da doença, status da infecção pelo FeLV e tratamento realizado. Os linfomas intestinais de baixo grau frequentemente resultam em tempo de sobrevida superior a dois anos, em gatos.
Na sua opinião como Oncologista, qual a maior dificuldade encontrada para se lidar com o Linfoma na medicina veterinária? Atualmente a maior dificuldade com os linfomas reside na resistência de Médicos Veterinários, e proprietários de animais, pela realização da biópsia, a fim de promover uma melhor caracterização da doença. O surgimento de novos protocolos, específicos para cada tipo de linfoma, depende da obtenção de um diagnóstico fenotípico e morfológico preciso, viabilizando assim melhor compreensão da doença e instituição de tratamentos mais eficazes. Em gatos, a leucopenia é muitas vezes limitante à continuidade da quimioterapia em gatos com linfoma, infectados pelo FeLV, e que necessitam, de protocolos mais intensos. Nos cães observa-se ainda reduzida resposta terapêutica nos linfomas cutâneos e gastrointestinais.
Você acredita que campanhas como a do Outubro Rosa, realizada para o câncer de mama, deveria ser realizada também para outros tipos de câncer como o Linfoma? Sim, assim como o câncer de mama, o linfoma pode ser prevenido, principalmente nos gatos, a partir do controle das infecções pelos retrovírus e adesão à vacinação para FeLV. O atendimento de gatos têm crescido nas grandes cidades, nos últimos anos, uma vez que exigem menos espaço e são, em geral, mais asseados, o que facilita a criação em apartamentos. É importante que os responsáveis por esses animais tomem o conhecimento sobre as principais doenças, cuidados e formas de prevenção.