Animal de estimação virou membro da família
Foi-se o tempo em que os animais de estimação eram criados no quintal de casa, comiam restos do almoço e tomavam banho de mangueira com água fria. À noite, os cães trabalhavam como guardas e os gatos caçavam os ratos. Quando muito, bicho de quatro patas era presente para criança.
Não é mais assim. Bicho de estimação é gente da família. A pesquisa da Consumoteca, feita em parceria com Exame PME, confrmou a impressão de muitas pessoas — os donos de cães, gatos, peixes e animais exóticos, como chinchilas e calopsitas, aquele passarinho com um imponente topete colorido que fica subindo pelo corpo das pessoas e aprende a falar e dar beijo, tratam seus bichos (quase) como filhos.
De acordo a Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação, a população de animais de estimação no Brasil já passa de 100 milhões. Produtos e serviços destinados à bicharada movimentaram 15 bilhões de reais no ano passado, colocando o Brasil na posição de segundo maior mercado do mundo.
Ficou atrás apenas dos Estados Unidos. Nos últimos dez anos, a expectativa de vida dos animais de companhia, que comem ração balanceada e tomam vacina, aumentou, no geral, 20%. O tempo de vida médio de um cachorro de porte pequeno é 12 anos, dois a mais do que no início da década passada.
A má notícia é que, igual aos humanos, conforme mais longa a vida do animal, maior a tendência de aparecerem problemas de saúde da velhice, como diabetes, câncer e problemas de coluna. A boa é que os serviços de medicina veterinária evoluíram. Há hospitais com centros oncológicos, clínicas de diagnóstico por imagem e plano de saúde — o que ajuda a alongar ainda mais a vida deles.
Uma empresa que atende animais idosos é a paulista Celltrovet, especializada em terapia de células-tronco para bichos. “Recolhemos, isolamos e armazenamos material genético para tratar doenças e lesões renais, articulares, ósseas, entre outros males da idade avançada”, diz o biotecnólogo Enrico Santos, de 42 anos, sócio da Celltrovet.
Seus clientes são os veterinários responsáveis pelos tratamentos. A administradora Isabela Carneiro, de 45 anos, e seu flho Lucca, de 20, moram num apartamento em São Paulo. Ela é mãe (é assim que os donos de cães e gatos se referem uns aos outros) do cachorro Cão, de 10 anos, e dos gatos Hannah, de 8 anos, e Lello, de 7.
Os três foram encontrados abandonados na rua. “Cuido deles como cuido do Lucca”, diz Isabela. Há pouco tempo, Hannah desenvolveu uma anemia séria, causada por insuficiência renal crônica, que costuma afetar felinos na terceira idade e pode começar aos 8 anos.
A gata precisava de três transfusões de sangue por mês. Quando o banco de sangue não dava conta, ela podia morrer. “Tive muito medo de perdê-la”, diz Isabela, que soube da Celltrovet por intermédio de uma veterinária.
Hannah recebeu três aplicações de células-tronco, doadas por Lello, ao custo total de 3.000 reais, cerca de 30% da renda mensal da família. Poucos meses após a terapia, os resultados dos exames sanguíneos e renais da gata estavam estáveis. “Foi caro, mas faria tudo de novo”, diz Isabela. “Fico feliz ao vê-la pulando pela casa.”
Como Isabela, muitos donos de animais moram em apartamentos pequenos. Não é o lugar ideal para os bichos, sobretudo cachorros, que em seus primórdios corriam em matilhas na natureza. Eles pedem passeios diários, ou a única alternativa para gastar a energia represada é cavar buracos imaginários no carpete ou roer o controle remoto — um pedido comum que as operadoras de TV por assinatura recebem é que a empresa mande, por favor, um controle novo.
Muitos donos trabalham, e não dá tempo de exercitar seus cães tanto quanto precisam. “Cachorro sedentário fica estressado e pode destruir a casa”, diz Kelly Lomonaco, de 35 anos, dona dos cockers Bartholomeu, de 7 anos, e Queen, de 2. É melhor, então, usar o dinheiro que seria gasto em mobília para pagar creches e hotéis, como o Clube de Cãompo, que faturou 1,1 milhão de reais no ano passado.
“Hospedamos os cães enquanto os donos trabalham ou viajam”, diz Aldo Macellaro, de 43 anos, dono do Clube de Cãompo, em Itu, no interior de São Paulo. Lá os hóspedes nadam na piscina e praticam agility, mistura de corrida e gincana em que os cães, guiados pelos donos ou adestradores, pulam obstáculos e atravessam túneis de lona colorida.
O que saber
Os principais hábitos dos donos de animais de estimação e como aproveitar seu potencial de consumo.
Mito: Bicho, só se tiver utilidade. Um cachorro, por exemplo, só serve para vigiar a casa ou entreter uma criança peralta. Gastos com saúde preventiva e alimentação balanceada é coisa de rico.
Realidade: Bichos são companhia para qualquer idade — há médicos que recomendam cachorros para diminuir a sensação de pessoas de idade, cujos filhos já constituíram família, de que elas não têm mais de quem cuidar. São vistos quase como crianças que requerem cuidados de saúde e educação.
Com ração balanceada e vacinas, eles estão vivendo mais e a medicina veterinária desenvolveu tratamentos para bichos na terceira idade. Como muitos animais vivem dentro de casa, os donos encaram os cuidados básicos com higiene como uma questão de saúde para a família.
Oportunidade: Alimentação é quase 70% do mercado pet e já é atendida por grandes empresas. As perspectivas estão em oferecer serviços que ajudem os donos a conciliar bicho e vida corrida, como creches, adestramento e cuidados com saúde e bem-estar. As receitas com serviços aumentaram mais de 17% em 2012 em relação a 2011 no Brasil.
Brinquedos feitos com material que não dá alergia estão sendo bem recebidos, assim como agências de turismo que organizam passeios para cachorros e seus donos, como tracking na mata.
Fonte: Site Exame